Por Paulo Furstenau*
Quais as diferenças entre vegetarianos e veganos? A diferenciação mais comumente usada e difundida faz uma divisão em três grupos básicos, embora se baseie em um equívoco — leia o texto até o fim!
1. Vegetariano: quem não come carne de nenhum animal. Existiriam, então, três tipos de vegetarianos:
— Ovolactovegetariano — quem não come carne de nenhum animal, mas consome ovos, leite animal e laticínios (pode consumir ou não mel);
— Lactovegetariano — quem não come carne de nenhum animal nem ovos, mas consome leite animal e laticínios (pode consumir ou não mel);
— Ovovegetariano — quem não come carne de nenhum animal nem consome leite animal ou laticínios, mas come ovos (pode consumir ou não mel).
2. Vegetariano estrito: quem não come carne de nenhum animal nem consome leite animal, laticínios (queijos, iogurtes, sorvetes, chocolates etc. feitos com leite animal), ovos ou mel.
Entre os vegetarianos estritos, há também grupos de pessoas como frugívoros (que só se alimentam de frutas), crudívoros (que se alimentam apenas de alimentos crus) etc.
3. Vegano: vegetariano estrito que não usa roupas, acessórios etc. de couro, lã, pele, pena ou seda; não frequenta "atrações" que utilizem animais, como zoológicos, circos e aquários; não usa produtos (alimentícios, cosméticos, limpeza etc.) de empresas que façam testes em animais; não pratica nem participa de rituais de qualquer religião ou crença que façam sacrifícios de animais.
(Um indivíduo vegetariano estrito não necessariamente é vegano: pode ser que ele exclua de sua alimentação todos os tipos de carne, leite animal, laticínios, ovos e mel, mas vista roupa de couro/lã/pele/pena/seda, use produtos de empresas que testam em animais, frequente locais de suposto "entretenimento" que exploram animais, pratique ou participe de rituais — de qualquer que seja a religião ou crença — que façam sacrifícios de animais.)
Veganismo não é só dieta!
Como se pode notar, o veganismo vai além da alimentação — é uma filosofia de vida a favor da completa abolição animal. Por isso, termos como 'dieta vegana' e 'comida vegana' são errôneos. Seria mais correto dizer 'dieta vegetariana estrita' ou 'comida vegetariana estrita', embora correto mesmo seria dizer simplesmente 'dieta ou comida vegetariana' — continue lendo.
Contudo, no dia a dia, o termo 'vegano' acabou pegando para ser usado também sobre a alimentação, referindo-se à comida sem carne ou qualquer outro ingrediente animal (leite, ovos e mel) como comida vegana (receita vegana, restaurante vegano etc.). Além disso, as próprias denominações 'ovolactovegetarianos', 'lactovegetarianos' e 'ovovegetarianos' são deturpações do conceito original de vegetarianismo, e isso tem uma causa histórica.
História
Donald Watson, fundador da The Vegan Society (Sociedade Vegana), lê a primeira cópia
do The Vegan News, informativo da entidade (Foto: Joe Connolly)
Em 1847, é criada a Vegetarian Society (Sociedade Vegetariana), no Reino Unido. Embora o termo ‘vegetariano’ já existisse em dicionários, foi a Sociedade Vegetariana que o sedimentou. E a definição era clara: vegetarianos eram aqueles que se alimentavam de vegetais, e não de animais nem nada vindo deles (leite, ovos e mel). “Tanto que a precursora da Sociedade Vegetariana, fundada em 1843, se chamava The British and Foreign Society for the Promotion of Humanity and Abstinence from Animal Food (Sociedade Britânica e Estrangeira para a Promoção do Humanitarismo e Abstinência de Produtos de Origem Animal), e não Sociedade pela Abstinência de Carnes”, destaca a Sociedade Vegana brasileira.
Em 1888, o presidente da Sociedade Vegetariana, J.B. Mayor, devido à baixa adesão de membros, flexibilizou o termo, incluindo no ‘vegetarianismo’ aquelas pessoas que consumiam leite, ovos e mel. Foi aí que surgiram termos como ‘ovolactovegetarianos’, ‘lactovegetarianos’ e ‘ovovegetarianos’ para definir os indivíduos que deixaram de comer carne, mas continuam se alimentando de secreções animais. No entanto, esses termos deturpam o conceito original e correto: uma pessoa vegetariana é alguém que se alimenta de vegetais. Incluir na palavra prefixos ligados à exploração animal é um equívoco.
Em 1944, Donald Watson funda a The Vegan Society (Sociedade Vegana), criando então o termo ‘veganismo’, que vai além da alimentação vegetariana (em seu sentido original). Eis sua definição, atualizada em 1979: “(...) uma filosofia e estilo de vida que procura excluir — na medida do possível e praticável — todas as formas de exploração e crueldade animal para comida, roupa ou qualquer outro propósito; e, por extensão, promove o desenvolvimento e uso de alternativas não animais para o benefício dos humanos, animais e meio ambiente. Em termos dietéticos, denota a prática de eliminar todos os produtos derivados integral ou parcialmente de animais”.
O Brasil também tem uma Sociedade Vegana, fundada em 2010. Avessa à distorção do conceito de vegetarianismo, ela cunhou o termo ‘protovegetarianismo’. O radical grego proto, muitas vezes traduzido como “primeiro” ou “primordial”, traz a ideia de algo rudimentar, ainda em formação. Assim, um indivíduo protovegetariano seria aquele que ainda não é vegetariano no sentido original da palavra, mas adota um hábito alimentar que tende para isso (ele é ovolactovegetariano, lactovegetariano ou ovovegetariano), não sendo possível afirmar que algum dia ele será realmente vegetariano. E nós complementamos aqui que o termo 'vegetariano estrito' nem deveria existir, pois ele foi criado apenas para diferenciar quem é REALMENTE vegetariano, e não haveria necessidade dessa definição se o conceito original de vegetarianismo não houvesse sido adulterado.
Resumindo
Embora o que vejamos no dia a dia seja o uso das definições apresentadas no início deste texto, o correto seria: vegetarianos não comem qualquer tipo de carne nem secreção animal (leite, ovos e mel) e veganos seguem a dieta vegetariana e vão além, não usando roupas nem acessórios de couro, lã, pele, pena ou seda, boicotando produtos de empresas que fazem testes em animais, não frequentando locais como zoológicos e circos com apresentação de animais, não praticando nem participando de rituais (seja de qual for a religião ou crença) que façam sacrifícios de animais etc. E pessoas que excluíram apenas a carne de seus cardápios, mas ainda consomem leite, ovos ou mel poderiam ser chamadas de protovegetarianas.
Devido a essa falta de consenso entre os termos, achamos importante esclarecer o assunto, para que você não se sinta perdido quando deparar com eles em leituras, conversas ou no cotidiano. E ficar alerta quando encontrar produtos ou restaurantes classificados como “vegetarianos”: dependendo de qual definição essas empresas seguirem (a original, estabelecida pela Sociedade Vegetariana, ou a mais usual hoje em dia), tais produtos ou pratos possivelmente têm leite, ovos ou mel.
Quanto a nós, da Natureza em Forma
Em nossos textos, usamos sempre o termo 'vegano', pois essa é nossa filosofia e desejo para a humanidade. Assim, dizemos que nossos eventos terão "comida vegana"; aqui em nosso blogue, e eventuais postagens em nossas redes sociais, é a mesma coisa. O próprio nome do marcador 'Veganismo na infância' aqui no blogue é um exemplo — e nele, há matérias que retratam crianças criadas dentro do veganismo, mas também aquelas que ainda são vegetarianas. Além disso, mantemos os termos usados nas matérias que replicamos — as nacionais e as traduzidas —, que ora usam 'vegano', ora usam 'vegetariano'.
Conclusão
Independentemente de nomes, o que importa mesmo é que cada um de nós façamos nossa parte, em direção a uma completa libertação animal. Ao contrário do que muitos pensam, não é difícil se tornar vegano, e atualizamos este blogue diariamente com informações que podem ajudá-lo e incentivá-lo nessa mudança de vida que será muito positiva não somente para os animais, mas também para a sua própria saúde e para o meio ambiente. E quanto mais veganos houver no mundo, mais fácil será essa mudança pessoal, pois maior será a oferta de produtos e serviços livres de crueldade animal para atender a esse público.
Como dissemos acima, essa é nossa filosofia e bandeira. Adiante, veganos! (“Go vegan”, em inglês, outro termo comum.)
*Paulo Furstenau é jornalista voluntário da Associação Natureza em Forma
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