Embora a manifestação mais comum do transtorno de acumulação (TA) seja com objetos, há uma vertente ainda pouco conhecida, mas que vem despertando atenção de pesquisadores de 2014 para cá: são os acumuladores de animais (no inglês, também chamado de "animal hoarding disorder").
Justamente por ser algo tão novo, ainda não existem estatísticas quanto à incidência da acumulação de animais na população. Por enquanto, só os dados gerais do TA – de 3% a 5% da população mundial.
“A acumulação de animais é uma manifestação do transtorno de acumulação. A grande diferença é que, em vez de objetos, a pessoa vai ter animais acumulados. Além disso, não é o número de animais, em si, mas as condições precárias em que eles e as pessoas vivem, sem condições mínimas de higiene e saneamento”, explica a psicóloga Tatiana Irigaray, professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Escola de Humanidades da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e coordenadora do grupo de pesquisa Avaliação, Reabilitação e Interação Homem-Animal (Ariha).
Justamente por ser algo tão novo, ainda não existem estatísticas quanto à incidência da acumulação de animais na população. Por enquanto, só os dados gerais do TA – de 3% a 5% da população mundial.
“A acumulação de animais é uma manifestação do transtorno de acumulação. A grande diferença é que, em vez de objetos, a pessoa vai ter animais acumulados. Além disso, não é o número de animais, em si, mas as condições precárias em que eles e as pessoas vivem, sem condições mínimas de higiene e saneamento”, explica a psicóloga Tatiana Irigaray, professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Escola de Humanidades da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e coordenadora do grupo de pesquisa Avaliação, Reabilitação e Interação Homem-Animal (Ariha).
A professora Tatiana é responsável por um dos primeiros estudos sobre o assunto no Brasil, iniciado em 2015. Com seu grupo de pesquisa, ela visitou 38 casas de acumuladores de animais em Porto Alegre (RS), que tinham sido identificados pela Secretaria Especial dos Direitos Animais (Seda), órgão da prefeitura da capital gaúcha. A maioria chegou ao conhecimento das autoridades através de denúncias de vizinhos.
Dessas 38 pessoas, o TA de animais foi identificado em 33. E o cenário era, quase sempre, o mesmo: casas deterioradas, animais sem cuidados e sem espaço – até gatos trancados em gaiolas de passarinho. Segundo ela, não é o número de animais que vai definir se a pessoa tem doença ou não: alguém com 20 animais em casa pode ter o transtorno, enquanto uma pessoa com 100 animais pode não ter.
“Um dos critérios para o transtorno é que a pessoa tenha uma capacidade de insight empobrecida. Sua capacidade de reconhecer o real estado dos animais e o seu próprio está comprometida. Quando nós perguntávamos, elas diziam que os animais estavam bem, que não tinham problema. Elas não conseguem perceber”, diz Tatiana.
Dos 33 acumuladores que participaram do estudo, 20 tinham mais de 60 anos. A maioria era mulher, morava sozinha e 70% ganhava de um a dois salários-mínimos. Além disso, de acordo com a professora Tatiana, a maior parte deles também passou por alguma situação traumática ou de perda.
Além disso, a média de tempo de acumulação ficava entre 20 e 30 anos. Nas 33 casas, foram encontrados 1,4 mil animais – uma média de 42 por residência, mas eles chegaram a encontrar 170 bichos num mesmo lugar. Cachorros e gatos são os principais animais dos acumuladores, mas, vez ou outra, aparecem alguns como aves.
Acreditam que vão salvar os animais
Um problema é que, se a pessoa acumula papel, por exemplo, não existe um vínculo. No caso dos animais, mesmo em péssimas condições, é provável que exista uma ligação. “Eles (acumuladores) não confiam em ninguém. Acham que ninguém pode cuidar (dos animais) melhor do que eles. Isso faz com que eles não doem e não permitam que os animais saiam para castração”, relata a professora Tatiana.
Na pesquisa, o grupo de Tatiana propôs três perfis diferentes de acumuladores: o salvador, que acha que sua missão de vida é salvar os animais, por isso sai recolhendo todos; o desorganizado, que acaba ficando com grande número de animais por não castrá-los e eles vão procriando; e, por fim, o perverso, que é aquele que tem algum lucro a partir dos animais.
Mas nenhum deles se vê como acumulador. Na verdade, para eles, é uma ofensa. Acreditam que recolhem os animais porque têm pena. “E, na realidade da pesquisa, a gente pensa que talvez o transtorno de acumulação de animais seja um outro transtorno, não só de acumulação. É um transtorno mental, mas talvez não seja acumulação porque a gente pensa que acumular vida é diferente de acumular objeto. Colocamos critérios pensando numa nova categoria da doença, mas são coisas ainda bem iniciais”, adianta a professora.
Por enquanto, não há nenhuma cidade no Brasil que Tatiana considere referência no tratamento de acumuladores de animais – justamente, por ser uma coisa tão nova. Por isso mesmo, não há um protocolo de tratamento estabelecido para os pacientes. Mas, ao longo de 2017, seu grupo deve tentar começar a desenvolver um protocolo, numa espécie de piloto de possível tratamento.
O que se sabe, de acordo com ela, é que, tanto na acumulação de objetos quanto na de animais, só tirar da casa não vai resolver a situação. Depois de um tempo, a pessoa volta a acumular tudo novamente. “O que a gente trabalha muito com acumuladores em geral é pensar com quantas coisas eles conseguem ficar e ainda ter um bem-estar na casa. Com os animais, também seria assim, mas, em alguns casos que acompanhamos, as pessoas sofreram uma ação e, de todos os animais, elas podiam ficar com cinco”, conta a professora Tatiana.
O senhor que tinha 170 animais em casa, por exemplo, foi um dos que ficaram com cinco, em fevereiro do ano passado. Em agosto, ele já tinha 20. Hoje, segundo ela, ele já tem mais de 100 novamente.
Em Salvador, entre os acompanhados pela prefeitura, só um dos acumuladores também parecia ter sintomas da acumulação de animais. Na casa de uma mulher, no bairro da Calçada, foram encontrados cinco gatos e dois cachorros.
Segundo a coordenadora de Projetos Especiais da Secretaria Municipal de Promoção Social, Esporte e Combate à Pobreza (Semps), Cláudia Cavalcanti, ela não percebia o problema e dividia a própria comida com os animais: “A situação é realmente precária. Eles (os acumuladores) vão substituindo o sentimento de perda familiar por animais”. Sete toneladas de lixo foram retiradas da casa da mulher. Os animais ficaram com ela, mas foram todos vacinados.
Fonte: Jornal Correio
Fotos: Luciano Cardoso / Seda
NOTA DA NATUREZA EM FORMA:
Somos contra qualquer forma de prisão de animais - zoológicos, gaiolas, aquários, abrigos, cachorros em correntes. E animais de acumuladores, por mais que essas pessoas tenham boas intenções, são prisioneiros - sendo o exemplo extremo relatado na matéria acima o dos gatos mantidos dentro de gaiolas. Cães e gatos precisam da companhia humana, e uma pessoa que possui dezenas e até centenas deles não pode se dedicar e dar a devida atenção e amor a cada um.
Lembramos ainda que esse comportamento de acumulação de animais pode ser explicado pelo temor das pessoas em relação à vida desses animais, o medo de que eles sejam recolhidos pelos Centros de Controle de Zoonoses (CCZs) e sacrificados. Em São Paulo, porém, a Lei 12.916/2008, do deputado Feliciano Filho, determinou que os animais saudáveis retirados das ruas não podem mais ser sacrificados. Diversos outros estados brasileiros reproduziram essa lei, também conhecida como Lei Feliciano - sobre os dois citados na matéria, Rio Grande do Sul é um deles (Lei 13.193/2009). A Bahia, infelizmente, ainda permite a matança de animais apenas por estarem nas ruas.
Mas seja qual for o motivo da acumulação de animais, situações como as descritas na matéria, de animais presos, com condições precárias de higiene e cuidados, configuram maus-tratos (saiba como denunciar maus-tratos contra os animais aqui). O denunciante pode, por meio da própria delegacia onde fizer a denúncia, efetuar solicitação judicial de mandado de busca e apreensão do animal. Isso poderá ser feito após a comprovação dos maus-tratos e registro do boletim de ocorrência ou termo circunstanciado, mas o denunciante deve auxiliar no processo de adoção dos animais (saiba como aqui), fator primordial para que o poder judiciário autorize sua retirada do local onde se encontram.
Se a denúncia de maus-tratos for feita em um estado onde ainda não seja proibido o sacrifício de animais - doentes e saudáveis - recolhidos nas ruas e não for promovida a adoção dos bichos caso sejam retirados de seu tutor acumulador, provavelmente eles serão sacrificados pelo Centro de Controle de Zoonoses. Assim, se você souber de algum caso de acumulador de animais, vale ponderar tudo isso.
A Lei 12.916/2008 já foi aprovada e sancionada em São Paulo, Alagoas, Amazonas, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Santa Catarina; foi aprovada no Mato Grosso do Sul e ainda tramita no Amapá, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso, Piauí, Roraima e Distrito Federal. Ou seja, os animais de rua dos estados do Acre, Bahia, Pará, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, Sergipe e Tocantins ainda são capturados e mortos pelos CCZs. Precisamos nos unir para que o poder público desses estados implemente lei semelhante e que os animais recolhidos sejam cuidados e colocados para adoção, e não levados a óbito.
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