"Defender os animais é uma questão de justiça", afirma pesquisador espanhol

Professor Oscar Horta, da Universidade de Santiago de Compostela, Espanha 
(Foto: Henrique Almeida / Agecom/UFSC)



Com o tema “Por que a defesa dos animais é uma questão de justiça: expandindo as fronteiras da ética”, a palestra do professor espanhol Oscar Horta, realizada em 26 de fevereiro [2018] no Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), apresentou os argumentos éticos que justificam o respeito pelos animais. “Muitas pessoas acreditam que aqueles que se envolvem na defesa dos animais decidem se dedicar à causa como um ‘hobby’ ou porque ‘gostam de animais’. Mas isso não é verdade. E não é pela mesma razão que as pessoas que lutam pelos direitos humanos não fazem isso simplesmente porque ‘gostam’ dos indivíduos em situações desfavorecidas. Devemos efetivamente respeitar os animais não por uma questão de ‘preferência’ ou como uma ‘atitude de bondade’, mas sim por uma questão de justiça”, explicou o pesquisador.

Segundo Oscar Horta, não existe um critério plausível e coerente que justifique, ao mesmo tempo, uma atitude de respeito pelos seres humanos e de desrespeito pelos animais. “Normalmente, a justificativa mais utilizada é a de que os seres humanos têm capacidades cognitivas avançadas, e por isso são ‘superiores’ e os únicos que merecem respeito. Mas quem defende isso ignora o fato de que há também animais não humanos que possuem capacidades cognitivas muito avançadas. E há nesse argumento outro problema ainda mais sério: existem seres humanos que não têm essas capacidades cognitivas. Esse é o caso dos recém-nascidos, por exemplo. E também pode ser o caso de qualquer pessoa que adquira uma doença ou sofra um acidente que lhe cause danos cerebrais. Todos estamos sujeitos a isso.” Diante desse argumento, explicou, a maioria das pessoas concorda que todos os seres humanos deveriam ser respeitados, sejam quais forem suas capacidades intelectuais. Logo, por uma questão de lógica, é preciso rejeitar a ideia de que deveríamos ter direitos garantidos por nossas capacidades intelectuais.

“Para garantir que nenhum ser humano seja discriminado, devemos rejeitar esses critérios e defender uma posição que implique necessariamente na consideração pelas demais espécies. Alguém pode dizer que ‘respeitar os animais é uma questão de preferência’. O fato é que, mesmo nas questões de gosto, de preferência, existe uma lógica, uma coerência. Não posso, ao mesmo tempo, dizer, por exemplo, que gosto de manga e não gosto de nenhuma fruta. Isso é uma contradição. O mesmo acontece aqui. É inconsistente a ideia de que devemos respeitar todos os seres humanos e não respeitar os demais animais por qualquer razão que seja. Alguém ainda pode dizer que essa discriminação é justificada ‘simplesmente porque somos seres humanos’. Mas isso não é uma justificativa. É apenas repetir, de outra maneira, o que está tentando defender.”

"É inconsistente a ideia de que devemos respeitar todos os seres humanos e não respeitar 
os demais animais por qualquer razão que seja" (Foto: Henrique Almeida / Agecom/UFSC)


O professor apresentou ao público a possibilidade de dois mundos possíveis: em um deles, os animais são explorados para os mais diversos fins, exatamente como ocorre no mundo hoje. Em outro mundo hipotético, os interesses dos animais não humanos são levados em consideração da mesma forma que os interesses dos humanos. “Se pudéssemos escolher, antes de nascer, em qual mundo vamos viver, qual escolheríamos?”, perguntou. “Muitos poderiam dizer que prefeririam morar no mundo como é hoje. Dizem isso porque supõem que vão nascer seres humanos. Mas e se houvesse a possibilidade de nascermos animais? E se não soubéssemos se seríamos humanos ou animais de outras espécies? Que mundo escolheríamos?” Ao fazer esse exercício de se colocar no lugar do outro, todos optam pelo mundo onde as demais espécies são respeitadas. 

Senciência

“Muitos animais têm a capacidade de sofrer e desfrutar, pois, assim como nós, eles têm uma fisiologia com um sistema nervoso central que transmite informações, a partir dos órgãos do sentido, e as transformam em experiências. Essas experiências podem ser positivas ou negativas, de prazer ou sofrimento. Além de sabermos dessa capacidade por sua fisiologia, isso também é evidente por seu comportamento. A conduta dos animais demonstra que eles sofrem, sentem. A razão, portanto, para respeitar alguém, deveria ser sua fisiologia, sua capacidade de sentir - isso é o que definimos como ‘senciência’. E essa é uma capacidade que não só os animais mais próximos de nós, como os mamíferos, possuem. Diversos outros animais, inclusive muitos invertebrados, também são sencientes. Por isso, não é justo que os animais utilizados pelos seres humanos sejam submetidos a tanto sofrimento.” O professor descreveu como vivem os animais explorados para alimentação, que passam a maior parte da vida em espaços minúsculos, sofrem de muitas doenças e não têm nenhuma oportunidade para desfrutar minimamente a vida. “Esses animais morrem de formas terríveis.”

Sobre a suposta necessidade de utilizar animais para alimentação, Horta explicou o que deve ser ponderado: “Quando temos que tomar uma decisão, devemos avaliar quais interesses estão implicados. No caso do consumo de animais, devemos analisar, por um lado, quais são os benefícios que os seres humanos têm e, por outro, quais os danos que sofrem os animais. Ao fazer essa avaliação, concluímos que os danos que sofrem os animais são bem maiores do que os benefícios que têm os seres humanos*. Se para obtermos esse mesmo benefício, precisássemos submeter não os animais, mas os seres humanos, aos mesmos danos, jamais faríamos isso”.

Material informativo da organização Ética Animal


Além de pesquisador e professor da Universidade de Santiago de Compostela, Oscar Horta integra a organização internacional Ética Animal, cujo objetivo é fornecer informações e promover discussões e debates sobre o assunto, buscando uma mudança de atitude em relação aos animais, conforme informa o site da entidade. A ONG tem representantes em diversos países e seu site está traduzido em oito idiomas: português, espanhol, francês, italiano, alemão, inglês, polonês e chinês.

Oscar Horta publicou, em 2017, o livro Un Paso Adelante en Defensa de los Animales. Leia aqui a introdução da obra, em espanhol.



NOTAS DA NATUREZA EM FORMA:

*1. Além disso, o consumo de animais causa diversos malefícios para a saúde humana, como tem sido provado por diversos estudos científicos nacionais e internacionais. Leia aqui.

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