Jumbo passeia com visitantes do zoológico de Londres;
peso provocou lesões nos quadris e joelhos do elefante (Foto: Wiki Commons)
Ele se tornou uma celebridade assim que chegou a Londres, onde multidões se aglomeravam para ver "o maior elefante do mundo". Jumbo, como era conhecido, desembarcou na capital britânica em 1865, vindo da África, onde foi capturado quando era filhote.
O elefante era tão popular na época que até os filhos da rainha Victoria eram seus fãs. Ele inspirou um dos filmes mais famosos da Disney: Dumbo (1941), que conta as aventuras de um elefante voador. E foi também a origem do apelido dado ao Boeing 747, devido ao tamanho da aeronave.
Um documentário da BBC, apresentado pelo renomado naturalista britânico David Attenborough, reuniu especialistas de diferentes áreas para examinar o esqueleto de Jumbo, que está no Museu de História Natural de Nova Iorque.
O naturalista David Attenborough e um grupo de cientistas examinaram
o esqueleto de Jumbo para um documentário da BBC (Foto: Humble Bee Films)
A ideia era desvendar alguns mistérios que rondam o célebre elefante. Como ele morreu exatamente? Por que sofria ataques de fúria? Será que ele foi realmente "o maior elefante do mundo"?
Os resultados da investigação causaram tanto surpresa quanto tristeza nos especialistas. O fato é que a vida real de Jumbo foi muito diferente da fantasia criada pelos estúdios Disney.
Uísque como calmante
Fotografias e gravuras da época mostram Jumbo no zoológico de Londres, carregando diversos visitantes - de crianças a adultos - nas "costas". Ter a oportunidade de "andar de Jumbo" era certamente uma das aventuras mais emocionantes para as crianças londrinas.
Mas o elefante que era manso durante o dia sofria "ataques de fúria" à noite - os acessos de raiva chegaram a danificar, em diversas ocasiões, as cercas de madeira que ficavam ao seu redor. Alguns relatos sugerem que Matthew Scott, o "cuidador" de Jumbo, costumava dar uísque ao animal para acalmá-lo.
O zoológico concluiu então que Jumbo poderia se tornar uma ameaça para o público e decidiu vendê-lo, em 1882, para o circo norte-americano PT Barnum. O animal se recusou, no entanto, a entrar em um curral de madeira para ser levado para o navio, quebrando várias vezes as correntes que tentavam contê-lo. E só concordou em embarcar quando os donos do circo aceitaram que Scott viajasse com ele - o "cuidador" conseguiu acalmá-lo.
Centenas de pessoas foram até o porto se despedir de Jumbo, que duas semanas depois desembarcaria na costa leste dos Estados Unidos. Em terras norte-americanas, o elefante continuou superpopular - percorreu todo o país com o circo, chegando até o Canadá. Mas morreu ainda jovem, com apenas 24 anos, quando foi atropelado por um trem, em um incidente rodeado de mistério.
Dores fortes
Jumbo, "o maior elefante do mundo", foi uma grande atração nos dois lados do Atlântico
(Foto: Wiki Commons)
Attenborough e um grupo de cientistas começaram então a examinar o esqueleto de Jumbo. O arqueólogo Richard Thomas, da Universidade de Leicester, no Reino Unido, observou que Jumbo tinha uma sobreposição incomum de camadas de ossos novos e velhos nos quadris.
"São sinais de lesões que seu organismo estava tentando reparar. Essas lesões devem ter sido incrivelmente dolorosas e foram resultado do peso que Jumbo teve de transportar, carregando grupos de visitantes", diz Thomas no documentário da BBC.
De acordo com Thomas, o excesso de peso também causou lesões no joelho do animal. "Quando olhamos seus joelhos, vemos todos os tipos de modificações que você não esperaria encontrar em um elefante daquela idade. Não esqueçam que Jumbo tinha apenas 24 anos e ainda estava crescendo. Seus ossos parecem mais com os de um elefante de 40 ou 50 anos."
Fúria noturna
Jumbo era muito popular entre as crianças, incluindo os filhos da rainha Victoria
(Foto: Wiki Commons)
Os ataques noturnos de fúria eram tão violentos que o animal desesperado chegou a quebrar, em algumas ocasiões, suas presas. E quando as presas começavam a crescer, o elefante as desgastava, esfregando-as contra as cercas.
Uma das autoridades do zoológico, Abraham Bartlett, atribuía o comportamento noturno de Jumbo a um fenômeno conhecido como must - período em que elefantes do sexo masculino apresentam comportamento agressivo, acompanhado de um forte aumento nos níveis hormonais.
Mas Vicki Fishlock, pesquisadora de elefantes baseada no Quênia, discorda. Segundo ela, se os hormônios tivessem sido a causa da ira de Jumbo, o elefante teria sido violento até mesmo com seus "cuidadores", o que não aconteceu.
Dentes deformados
O "cuidador" de Jumbo, Matthew Scott, conseguiu acalmar o elefante
para embarcar no navio rumo aos Estados Unidos (Foto: Wiki Commons)
Os cientistas encontraram no crânio do animal uma pista que também pode explicar o comportamento violento - malformações muito pronunciadas nos dentes. "Os elefantes têm seis dentes, mas apenas um de cada lado se desgasta em determinado momento. Quando o dente cai, outro nasce para substituí-lo, mas se o dente velho não se desgasta o suficiente, não cai, fazendo com que o novo dente fique deformado", explica Thomas.
A dieta de Jumbo no zoológico e no circo era bem diferente da de um elefante em seu habitat natural, onde os animais comem uma variedade de vegetação que permite a eles desgastar os dentes.
A conclusão de Thomas é que Jumbo "sofria com uma dor de dente terrível", que ficava mais latente durante a noite, quando não havia distrações. E provocava os ataques.
Tamanho
Jumbo ganhou estátua em St. Thomas, em Ontário, no Canadá, onde ele morreu
(Foto: Wiki Commons)
Mas Jumbo era realmente o maior elefante do mundo? Talvez sim, dizem os pesquisadores do documentário da BBC. Uma fenda na cabeça de seu fêmur indica que o elefante ainda estava crescendo quando morreu.
Ao analisar os ossos, os cientistas determinaram que ele tinha uma altura de 3,45 metros, do ombro até o chão. Um elefante africano selvagem da mesma idade tem, em média, 2,84 metros. E Jumbo ainda estava em fase de crescimento, então poderia ter se tornado o maior elefante africano do mundo, de acordo com Thomas.
Pelos da cauda
A cauda embalsamada de Jumbo foi salva de um incêndio e se encontra
nos arquivos da Universidade Tufts, em Massachusetts (Foto: Wiki Commons)
Após a morte, o corpo de Jumbo foi embalsamado e preservado pela Universidade Tufts, em Massachusetts, nos Estados Unidos. Um incêndio destruiu os restos mortais do animal, com exceção do rabo, que a pesquisadora Holly Miller, da Universidade de Nottingham, na Inglaterra, analisou para descobrir sua dieta.
Holly encontrou grandes níveis de nitrogênio nos pelos da cauda de Jumbo, o que indica que ele não era saudável. Segundo ela, o corpo do animal não recebia os nutrientes necessários, e seu organismo extraía níveis anormais de nitrogênio dos alimentos na tentativa de cicatrizar as frequentes lesões.
Morte misteriosa
Matthew Scott, o "cuidador" de Jumbo, aparece junto às orelhas do elefante
em foto tirada após a morte do animal (Foto: Wiki Commons)
A vida de Jumbo chegou ao fim quando ele e outro elefante menor embarcaram em um trem na cidade de St. Thomas, em Ontário, no Canadá. Jumbo ganhou uma estátua na cidade - e o museu local é quase um memorial do elefante.
Entre as muitas fotografias e gravuras do acervo, uma chamou a atenção de Attenborough. A imagem mostra Jumbo morto após a colisão com o trem - e é possível observar marcas profundas em seu quadril.
O dono do circo disse inicialmente que ele teria se jogado na frente do trem para proteger heroicamente o elefante menor. Mas as marcas indicam que, na realidade, o trem atropelou Jumbo por trás, quando o elefante estava sendo embarcado em um vagão.
O esqueleto que está no Museu de História Natural de Nova Iorque não apresenta fraturas, o que fez os cientistas concluírem que Jumbo morreu de hemorragia interna.
Elefantes "aposentados"
Na foto, as longas presas de um elefante africano, que não estavam presentes em Jumbo
porque quebraram ou foram desgastadas devido ao estresse (Foto: Getty Images)
A história de Jumbo tem contornos muito atuais. Attenborough visitou um santuário no Tennessee, nos Estados Unidos, para elefantes de circo "aposentados" - e muitos animais que estão ali apresentam sintomas semelhantes aos de Jumbo. Os elefantes do santuário têm as presas desgastadas, e esfregam-nas constantemente em sinal de agitação e estresse.
Segundo Vicki Fishlock, zoológicos e circos não podem ser o lar de elefantes como Jumbo*. Eles devem viver em seu habitat natural - são animais sociais, que precisam de contato com seus pares, de acordo com a pesquisadora.
Fonte: BBC Brasil
NOTAS DA NATUREZA EM FORMA:
*1. Zoológicos e circos não podem ser o lar de NENHUM animal.
2. Originalmente, o texto acima publicado pela BBC Brasil não coloca a palavra 'cuidador' entre aspas. Nós fizemos isso porque essas pessoas, na verdade, não passam de exploradores de animais.
3. E a exploração de elefantes (e todos os outros animais do planeta) continua acontecendo nas mais diversas modalidades, sempre com o objetivo de render lucro ao ser humano. Leia também:
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