AquaRio: na contramão do mundo civilizado



Por Marli Moraes*


Enquanto o Sea World agoniza sem resistência de sua jornada perversa, enquanto o TripAdvisor deixa de vender ingressos para espetáculos onde animais são escravizados, enquanto zoológicos fecham mundo afora, a cidade do Rio de Janeiro nos oferta um cálice de fel inaugurando um cativeiro aquático, atração que, digamos assim, chega à cidade com mais de 100 anos de atraso. Em outra época, seria aclamado, sem críticas. Porém, na era das redes sociais, onde nada mais fica oculto, as críticas são inevitáveis.

O AquaRio se autoproclama um "empreendimento privado". Contudo fica difícil dissociar a grande influência política ocorrida nesse feito quando sabemos que o espaço físico é público, exatamente onde funcionava o armazém da Cibrazem e cedido aos autores da proposta indecorosa no dia 9/4/2007, de acordo com a folha 42 do Diário Oficial do município de 14/12/2006.

Ora, até uma criança sabe que uma concessão só é concedida com muito apoio político. Qualquer pedágio, qualquer estacionamento, qualquer uso de espaço público tem sempre um político na jogada. Mais uma vez, mostramos que ainda vivemos na terra onde os "amigos do rei ganham tudo".

Como se isso fosse pouco, entrou para a sociedade a empresa Cataratas do Iguaçu, que administra o trenzinho do Corcovado e também outra empresa de grande porte em Foz do Iguaçu, além de ser concessionária única do zoológico onde pretende perpetuar a escravidão animal, ou seja, temos aí o monopólio do lazer de grande porte bem protegido pelo nome Sávio Neves - sim, parente do Senador Aécio Neves. Tudo em casa…

Para melhorar a situação, o AquaRio foi beneficiado com a isenção de ICMS sobre as placas de acrílico que irão aprisionar os animais, gesto "bondoso" do governador Pezão, que tirou dos cofres públicos a receita através do decreto 45.303, de 3/7/2015. Como se pode ver, quem tem padrinho não morre pagão.

Podemos concluir que o único item privado é o lucro dos ingressos e vendas casadas, além de patrocínios como a Coca-Cola, que se dispõe a participar de um projeto criticado no mundo todo.

Vergonha aquática já nos basta o Aquário de São Paulo, que mantém dois ursos polares prisioneiros. E para que tudo isso, se não para aprisionar animais em banheiras quando eles nasceram com a imensidão do mar ao seu dispor? Vão ensinar o que às pessoas? Só mentiras.

"O AquaRio vai servir de aprendizado"… Como assim? Vão ensinar o quê se o universo marinho ainda é um grande desconhecido? Sabemos muito mais de Marte e da lua do que do fundo do mar, ignoramos as rotas migratórias da maioria dos animais, seus meios de reprodução, períodos migratórios, sabemos nada sobre a fauna marinha ou sabemos muito pouco ainda, e mesmo os tão atrativos tubarões ainda são uma grande incógnita. E como vão ensinar se esses lugares só servem mesmo de lazer, distração e risadas?

E para que animais vivos se a teoria não pode ser vista na prática, já que os animais estarão limitadíssimos em suas características naturais? Ficam nadando de uma parede à outra, movimentos repetitivos que levam ao estresse, visível a todos como se pode ver nos malditos zoológicos. Se a taxa de mortalidade é alta, não tem problema, é só encomendar mais outro exemplar…

Li em algum lugar que "peixe não tinha família", ora, não sei se já viram um monte de peixes nadando próximos uns aos outros… Aquilo que chamamos de cardume, para eles é o meio de sobrevivência, a espécie se protegendo, portanto, eles têm, sim, noção de bando, de família.

* Marli Moraes, carioca da gema, é dona de casa, presidente da Resgato - sociedade civil sem fins lucrativos - e ativista pelos direitos dos animais


Foto: Divulgação

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