E se Jesus comparecesse a sua ceia?

     Foto: Wilson Kubwaio


Por Luh Pires* 

“Jesus entrou na sala, mas o barulho não permitiu que ninguém o percebesse. Ele tentou se comunicar, mas era hora da troca de presentes. Por um segundo, olhou para a mesa, mas ficou devastado com o que viu! Jesus chorou e foi embora sem entender onde errou.”

Então é final de ano outra vez e centenas de milhares de pessoas se preparam para comemorar o Natal. Em meados do século 4 d.C., iniciaram as primeiras comemorações do nascimento de Jesus Cristo. Embora a verdadeira data do nascimento de Jesus não seja conhecida, o Natal começou a ser celebrado em 25 de dezembro.

Desde então, a tradição passou a se perpetuar até os dias de hoje. Famílias se reúnem, fazem orações e reproduzem um cardápio específico para confraternizar com a data. No mês de dezembro, muitas instituições preparam ações beneficentes em prol dos necessitados. A atmosfera se camufla entre comunhão, correria e, para muitos, angústia e desespero. O comércio passa a faturar mais do que nunca e a publicidade cria peças tradicionais de amor, espiritualidade e caridade.

Mas as contradições humanas ficam ainda mais acentuadas no Natal. Se essa é a comemoração do nascimento de um mestre que pregou o amor, a compaixão e a caridade, então por que tudo que a envolve beira a ostentação, o consumo e as demonstrações mais glutonas?

A base de todo o fundamento religioso é – ou deveria ser – o amor e a benevolência como ferramenta de evolução espiritual. Porém as ações de Natal parecem não passar de um pano óptico que camufla a origem de todos os males do mundo, oriundos da ganância, falta de compaixão, ego, vaidade, soberba e tradições que tornam o indivíduo cada vez mais escravo dos mecanismos da sociedade: competição excessiva, consumo desenfreado, vícios, falta de ética, preconceito, degradação da natureza, desperdício de alimentos e desmoralização de raças e espécies.

Nesta época, chamam a atenção nas redes sociais postagens em que as criancinhas serão beneficiadas pelo valor arrecadado por um galeto ou churrasco beneficente e até rifas de animais que serão esquartejados em prol de caridade.

Na mesa da ceia, o peru está lá - quando não um, são dois ou até três. Além dele, a doentia cena do leitão com apenas três ou quatro meses assado com a famigerada maçã na boca. Um contraste entre a comunhão humana e o bizarro show de horrores que é o Natal.

Os seres humanos julgam-se tão superiores a todas as espécies pela mais pura falta de conhecimento sobre os horrores submersos na tradicional ceia natalina, que nem mesmo os valores mais simples aparecem para cumprir uma evolução moral e ética. Tudo parece desintegrar nos pernis impostos por todas as repartições através do vale-peru, nos presentes, nas ações que visam à caridade obrigatória de fim de ano.

Para os que necessitam de algum cunho religioso para compreender um algo a mais do que a simples compaixão, há um texto do livro Missionários da Luz (André Luiz, capítulo 4) que narra a seguinte frase: “Os animais selvagens fogem ao homem a qualquer constituição, mas os animais domésticos, por confiarem em nós, se submetem ao cutelo no matadouro, muitas vezes entre lágrimas de aflição, incapazes de discernir onde começa a nossa perversidade e onde termina a nossa compreensão”.

Equivocadamente, pensamos que os corpos dos animais foram feitos para nos alimentar; não entendemos, por conseguinte, que essa é uma concepção errônea vinda do marketing das indústrias frigoríficas que bombardeiam publicidade para que o consumo animal aconteça em detrimento de milionárias arrecadações financeiras que degradam o meio ambiente e promovem um verdadeiro holocausto em nossos irmãos que habitam corpos diferentes do nosso.

Além disso, os prejuízos da carne do animal que tanto sofreu para chegar à alimentação humana foram oficializados em mais de três mil estudos científicos que apontam que o consumo de produtos de origem animal causam câncer, reumatismo, arteriosclerose, infarto, gastrite, AVC e tantas outras epidemias.

Mas se o Natal não é sobre nós, e se não é sobre eles, se o Natal é sobre Jesus, deixo aqui a pergunta: será que esse tipo de comemoração o agradaria?

                            Fotos: Reprodução


*Luh Pires é ativista e fundadora do Grupo Resgate na Rede, que une profissionais de diversas áreas do Brasil para atuar em ativismo direto ou consultoria para resgate de indivíduos ou manadas

Fonte: Olhar Animal  

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