Ellen G. White: “Essas criaturas são guiadas para a morte, para que os seres humanos se banqueteiem com suas carcaças”

Ellen G. White: “Animais são frequentemente transportados 
por longas distâncias e sujeitos a grande sofrimento 
até chegarem ao mercado” (Foto: Ellen G. White Estate)


Escritora e uma das fundadoras da Igreja Adventista do Sétimo Dia, Ellen Gould White se tornou uma das personalidades mais controversas de seu tempo pela sua obstinada defesa do vegetarianismo, promovendo-o inclusive em escolas, hospitais e centros médicos. Entre suas obras mais famosas que também versam contra o consumo de animais, está o livro A Ciência do Bom Viver (The Ministry of Healing), publicado em 1905.

No entanto, Healthful Living, de 1896, foi uma das primeiras obras em que Ellen G. White abordou o vegetarianismo. Na página 97, ela declara que a dieta de muitos animais é baseada simplesmente em vegetais e grãos, e que o ser humano deveria seguir esse exemplo, já que não temos o direito de nos alimentarmos de criaturas mortas. Segundo Ellen, um animal que não seja essencialmente carnívoro não tem necessidade de destruir outro animal para se alimentar. No livro Conselhos sobre o Regime Alimentar (Counsels on Diet and Foods), de 1903, a autora diz que vegetais, frutas e grãos são o suficiente para uma alimentação saudável e bem completa. “Nem uma onça [28 gramas] de carne deve ser enfiada em nossos estômagos. Devemos voltar ao propósito original de Deus na criação do homem”, defende na página 380.

Com livros publicados em mais de 140 idiomas, Ellen Gould White se tornou bastante influente à sua época. Ela foi uma escritora e oradora incansável, chegando a escrever mais de cinco mil artigos e publicar 40 livros. Suas obras somam mais de 50 mil páginas manuscritas, segundo o artigo Ellen G. White: A Brief Biography, de Arthur L. White, publicado no The Official Ellen G. White Website em agosto de 2000.

Em A Ciência do Bom Viver, a escritora afirma que a dieta indicada ao ser humano no princípio não incluía alimento de origem animal. “Não foi senão depois do dilúvio, quando tudo quanto era verde na Terra havia sido destruído, que o homem recebeu permissão para comer carne”, escreveu. Porém, segundo a escritora, foi uma permissão temporária. Ellen faz a ressalva de que Deus escolheu a comida dos seres humanos quando os levou para viverem no Éden, o que não compreendia nada de origem animal.

Porém, na perspectiva de Ellen, o ser humano insistiu no consumo de carne, e em decorrência disso, teve de amargar inúmeras doenças e muitas mortes relacionadas a esse hábito. “Os que se alimentam de carne estão comendo nada mais que cereais e verduras, pois o animal recebe a partir desses alimentos a nutrição que garante seu crescimento. A vida que havia no cereal e na verdura passa aos que os ingerem. Nós a recebemos comendo a carne do animal. Melhor é obtê-la diretamente, comendo aquilo que Deus proveu para o nosso uso.”

Ellen defendia que a inteligência de muitos animais é tão semelhante 
à inteligência humana que chega a ser um mistério (Arte: Ellen G. White Estate)


Outro ponto que, segundo a escritora, deveria ser o suficiente para desconsiderar a carne como alimento é o surgimento de doenças que só existem em decorrência da criação de animais para consumo. “A população come ininterruptamente carne cheia de germes de tuberculose e câncer. Assim são transmitidas essas e outras doenças. Muitas vezes, são vendidas as carnes de animais que estavam tão doentes que os donos receavam mantê-los vivos por mais tempo. E o processo de engorda para a venda produz enfermidades”, critica.

No final do século 19, Ellen White percebeu que já era comum os animais serem privados da luz do dia e do ar puro, respirando somente a atmosfera de estábulos imundos, e talvez sendo alimentados com comida deteriorada, o que facilitava a contaminação e proliferação de doenças: “Animais são frequentemente transportados por longas distâncias e sujeitos a grande sofrimento até chegarem ao mercado. Privados dos campos verdes para viajarem por longas milhas em estradas quentes e empoeiradas, dentro de veículos imundos e lotados, eles ficam febris e exaustos, e passam muitas horas em privação de água e comida. Essas criaturas são guiadas para a morte, para que os seres humanos se banqueteiem com suas carcaças”.

Para Ellen G. White, a situação dos peixes não é diferente, levando em conta a contaminação das águas e a ausência de boa matéria orgânica como fonte de alimento. Além de sofrerem pela má intervenção humana, quando morrem tornam-se alimentos, um alimento que também ocasiona enfermidades. “Muitos [seres humanos] morrem de doenças devido ao uso da carne, e essa causa não é suspeitada por eles nem pelos outros”, enfatiza.

Além das questões envolvendo saúde e religião, a escritora apontava como igualmente importante as implicações morais do consumo de carne. Quando discursava sobre o tema, ela pedia que os espectadores pensassem na crueldade por trás do consumo de carne, e os efeitos que isso desencadeia na vida em sociedade, onde a ternura com as outras criaturas é majoritariamente desconsiderada.

Em A Ciência do Bom Viver, Ellen defende que a inteligência de muitos animais é tão semelhante à inteligência humana que chega a ser um mistério. Observa que os animais veem, ouvem, amam, temem e sofrem; servem-se de suas capacidades melhor do que os seres humanos. Manifestam simpatia e ternura em relação aos seus companheiros de sofrimento: “Muitos animais demonstram aos seus uma afeição muito superior àquela manifestada por alguns seres humanos. Que homem, dotado de um coração humano, havendo já cuidado de animais domesticados, poderia fitá-los nos olhos tão cheios de confiança e afeição, e entregá-los voluntariamente à faca do açougueiro? Como lhes poderia devorar a carne como algo delicioso?”.

“Educai a consciência, aliciai a vontade, mostre o caminho do bom e 
saudável alimento e a mudança acontecerá rapidamente, fazendo 
desaparecer a necessidade de carne” (Arte: Ellen G. White Estate)


No início do século 20, a autora já considerava um equívoco crer que a força muscular dependa do uso de alimento de origem animal, já que podemos recorrer a cereais, frutas e oleaginosas, alimentos que contêm tudo que é necessário à nossa nutrição. “Quando se deixa o uso de carne, há muitas vezes uma sensação de fraqueza ou falta de vigor. Muitos alegam isso como prova de que a carne seja essencial. Mas é devido a esse alimento ser estimulante, deixar o sangue febril e os nervos estimulados, que assim lhes parece ser algo que faz falta. Alguns acham tão difícil deixar de comer carne quanto é para um bêbado deixar o álcool. Mas logo se sentirão muito melhor com a mudança”, garante.

Na defesa da abstenção de alimentos de origem animal, Ellen Gould White jamais viu o vegetarianismo como uma impossibilidade. Ela acreditava que, mesmo em países com maiores índices de pobreza, é possível implementar hábitos vegetarianos na população mais carente; e sugeria a realização de pesquisas e a discussão sobre meios de incentivar a produção de alimentos de origem vegetal. “Com cuidado e habilidade, é possível preparar pratos nutritivos e saborosos, substituindo a carne. Em todos os casos, educai a consciência, aliciai a vontade, mostre o caminho do bom e saudável alimento e a mudança acontecerá rapidamente, fazendo desaparecer a necessidade de carne. Já não é tempo de todos dispensarem a carne da alimentação?”, questionou no capítulo A Carne como Alimento, do livro A Ciência do Bom Viver, publicado em 1905.

Ellen Gould White nasceu em Gorham, no Maine, em 26 de novembro de 1827, e faleceu em Elmshaven (Santa Helena), na Califórnia, em 16 de julho de 1915.


Referências

White, Ellen G. The Ministry of Healing (1905). Ellen G. White State (2013). (Disponível em https://egwwritings.org)

White, Ellen G. Healthful Living (1896). Ellen G. White State (2013). (Disponível em https://egwwritings.org)

White, Ellen G. Counsels on Diet and Foods (1903). (Disponível em https://egwwritings.org)

White, Arthur L. Ellen G. White: A Brief Biography. (Disponível em http://www.whiteestate.org/about/egwbio.asp)


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